Há
quantos anos apanho conchas na areia da praia? Tenho uma coleção delas, por
todos os lados. Um dia me disseram que as conchas marinhas são as asas partidas
dos anjos caídos.
Quando
o mar ressaca, os anjos caem apunhalados pelos seus próprios desejos, e deixam
as suas asas na beira do mar. Desde então, na maré baixa, saio à procura das
mais belas espécies. Outrora bivalves brancas e enrugadas; hoje, coloridas e
ornamentadas.
Ainda
na praia, avisto os anjos caídos, curvados e sôfregos a procura das profundezas
mais execráveis. Tornaram-se criaturas diabólicas sem a presença da luz, e
indignados se escondem pelas sombras dos homens. Afasto-me, não sem sentir dó
dessas almas frívolas e atormentadas.
Li
em algum lugar que os anjos, como os humanos, têm livre-arbítrio: podem fazer
escolhas. E alguns decidem deixar suas relíquias preciosas a seres que podem
compreender as suas agonias.
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